terça-feira, 18 de maio de 2010

JOÃO.

Eu o conheci no lixão. Podre, úmido, mofado, largado lá. Mesmo assim imponente, firme e resistente às intempéries naturais da natureza de sua vida. Eu já vinha pensando em valores sobre adoção por um bom tempo. Tive ali a opção e, ele, sua apresentação. Acolhi, banhei, lapidei e, por um longo período, independente do peso, não conseguia sair sem ele... nem sem apresentá-lo. Acoplado, novo comparsa e amigo silencioso era ele, João.
Irônico o surgimento repentino dele em momentos de muita solidão minha. Encontros, soluções matemáticas para compor almas solitárias. Creio bem que fomos assim um para o outro. Minha primeira vez de batizar alguém, João, que por muitos foi elogiado por sua gama de possibilidades de interpretação pelo nome. Fosse corriqueiro, bíblico, entre outros etecéteras analógicos, para mim era só um nome e coisa nova. E, ainda assim, não era SÓ isso, era demais.
Tomamos cafés criticados pela sociedade ao redor, vimos palestras, nas quais ele nunca se permitiu colocar sua opinião – ou sim... visto que o silêncio tem lá suas grandes potências. Muito sol que ele carregou tomando em minha (nossa) varanda, o que o levou no tom de pele marronzinho que ainda permanece.
Uma amiga resolveu ir pra Espanha. Não me recordo bem porque o João se escondeu no porta-malas dela. Talvez uma dessas pós-tardes lisérgicas com Joanar.  João se escondeu em uma bolsa de viagem, fugiu de mim e tornou-se anônimo internacional. Triste fiquei e, tempos depois, esqueci – ou fiz de conta que.
Passaram-se quatro anos daquela fuga.
No meio de um trabalho em um lugar quase abandonado aonde, ultimamente, passo todas as tardes mofando e vendo a cor do dia mudar até pegar o meu microônibus de volta pra casa de meus temores, lá estava ele no dia de ontem: desgastado, com seu nome apagado, molhado, mofado, na tentativa de um novo cuidado e abrigo. Costumo ser bem rancoroso. Com João, jamais poderia ser.
Limpei, acolhi, sequei, limpei e renovei seu nome.
O tenho de volta e, agora, ele não me escapa mais. Nem eu dele.
Prazer, de novo, João.


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