terça-feira, 11 de maio de 2010

DESFORME.

Joana, ou JOANAR. Esse era o nome artístico que a moça resolveu se titular por remeter, ao mesmo tempo, a um verbo quanto ao seu nome. Identidade ativa. Joanar foi daquelas amizades de explosiva intensidade e que te levam para lugares incomuns, obscuros, estranhos... E deliciosos. A moça licenciada e este moço aqui bacharel. Joanar tinha problemas de conceitualização. Eu tinha problemas de libertação. Nosso relacionamento apaixonado e sem sexo foi inaugurado em 2005.
Igualdade dos fatores vitais (lembrando de Arthur Araújo): aproximamos-nos com corações partidos em tardes de brincadeiras alucinógenas no parque do Ibirapuera. Grudamos, permanecemos. Sempre visitava sua vila, aonde se encontrava sua casa de arquitetura e decoração espanhola nos jardins, SP. Uma destas visitas foi marinada com um convite ousado (nada menos a se esperar de Joanar): leves doses de Johnnie Walker e uma lata de tinta serigráfica branca que a moça havia roubado da faculdade. Bebemos, nos despimos e passamos a tinta em todos cantos e orifícios existentes em nós. Brancos. Bêbados. Serigrafados.
Uma câmera Cannon na mão e fotos de nossa modificação de estado alcoólico e material (a tinta nos envermelhecia a pele, os olhos e a mente). Surpresa na nossa capacidade de foco nas fotos com a falta de foco na visão.
Domingo, dia seguinte. Banho com sabonete líquido que, em sua sofisticação de produto e uso, nada tem de praticidade quando se pretende tirar nacos secos de tinta de seus pêlos e buracos. Joanar me visita com uma maleta (contendo todo material artístico básico que se imagine – lápis, caneta, fitas adesivas, guaches, pincéis, papéis, colas, tesouras, barbantes e por aí estrada afora) e uma nova proposta: encontrar uma caçamba com muitos dejetos na Oscar Freire e oferecer estes materiais, junto às ferramentas da maleta, para que crianças de rua produzissem o que quisessem. O que pretendíamos como uma generosidade lúdica e, também, um ataque à circulação burguesa do local, tornou-se triunfo e falha, mas tudo em campos positivos.
Triunfo: muitos garotos(as) de rua produziram e expuseram seus resultados na calçada na frente da M. Officer. Falha positiva: os burgueses resolveram comprar tudo, por afeto, caridade e outros motivos irreconhecíveis. Demos toda a arrecadação, igualmente dividida, para as crianças.
Queríamos tentar um concurso visual com este trabalho. Por fim, resolvemos que a bebedeira e a tinta serigráfica teriam, talvez, mais potência do que o trabalho caridoso. Talvez menos potente de sentimento e intenção mas, talvez, mais forte visualmente.
Mundo injusto?
Nós acertamos na escolha.

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