segunda-feira, 19 de julho de 2010

PARA O CONTEÚDO DE COISAS IMÓVEIS.

Recebi um desafio: ser um livro em uma performance. Ser livro. Fiquei com essa proposta me indagando mais interrogatoriamente do que me afirmando respostas. Uma delícia isto, penso automaticamente mas, naquele momento, com prazo de entrega e montagem, nem tanto. Iniciei pelas obviedades; letras, frases, páginas, marcador, capítulos, título, parágrafos. Nada parecia me comunicar bem com corpo, enquanto matéria final da coisa a ser proposta. Resolvi esquecer o LIVRO como assunto e pensar em OBJETO.
Como ser objeto? O que é objeto?  Para mim, algo inanimado, com alguma função ou não mas, sem dúvida, sem possuir organicidade, vida, pulso. Impossível ser isso. Posso tentar plagiar as esculturas vivas da praça da sé e, ainda assim, respiro, pisco, existo como metáfora e imitação. Não sou a coisa. Sou gente. O que seria, então, um ser-humano-objeto? Um boneco talvez. Ou um corpo morto. Este virou carcaça e coisa que é só matéria (me lembro de assuntos como corpos depositados ,como lixo, no nazismo). Pensava em coma, naquela imobilização hospitalar e, mesmo assim, humano, pois o cérebro parou, mas o coração permaneceu.
Por essas linhas tortas, poderia eu tentar ficar imóvel, sem piscar ou me mexer. Inevitável: ainda tenho coração e cérebro e, além disso, os dois ultra ativos. Por si só não seria. Precisava de alguma comparação. Já que não serei, tentarei ser o mais próximo daquilo. Assim foi.
Reflexões finais: animais (como, também, nós) transformados em objetos. Existem? Pensei nos empalhados e nos de pelúcia. O primeiro me trouxe alguma agressividade que ali não pretendia. Pelúcia então e, assim, pensando sobre qual animal seria iconográfico para isso: urso. Eis meu comparativo.
Entre grades de proteção e, ao mesmo tempo, limitações, vitrines e separações animalescas, ali ficamos; eu e Abramo (o urso) por certas horas. Doeram-me demais tantas permanências físicas e cerebrais. Não ganharia do Abramo no quesito permanência estática... Mas creio que ganhei por desistir. Ele ficou lá, lá ainda está e não parece ligar pra isso. E eu pensando nele. Não sei bem se ganhei.

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