domingo, 25 de abril de 2010

RE-FEIÇÕES



Primeiro ano na faculdade de artes visuais. Andava estreitando as primeiras pinceladas de amizades que não mantive corretamente trocando seus antigos termos de amigos para os atuais de colegas. Entre estes havia uma Natália e uma Emília que perduraram comigo por bons anos em todas experiências doidas – ao mesmo tempo altamente clichês – que precisamos obter na universidade.

Recordo-me de estar muito inquieto com relação ao futuro profissional por não me enquadrar em linguagem alguma. Ou não sabia fazer ou não gostava. Hoje tenho um diploma que diz BACHAREL EM ARTES VISUAIS – PINTURA, GRAVURA E ESCULTURA. A piada é que não faço, ou nunca fiz seriamente, nenhuma das três. Minhas experiências em expressão artística eram o teatro, o trabalho do ator, um piano que me dediquei alguns anos, e, também, uns estudos de clown e trabalhos como palhaço.

Natália, que considero uma excelente atriz, na época foi convidada a participar de uma exposição, como performer, em um trabalho elaborado por Alice K – atriz, performer e, ao menos na época, parte da banca de seleção de artes cênicas da Unicamp. Emília foi convidada por Natália pela necessidade de serem duas pessoas e, mais especificamente, mulheres. Fui assistir a primeira performance de minha vida.

Entro na exposição e percebo um cenário em uma sala: um grande balde branco, cheio de pipocas, ao centro de duas cadeiras brancas de frente para a outra. Um cheiro forte de talco permanecia no ambiente. Continuo o passeio pela exposição e encontro Natália e Emília, em pontos diferentes da galeria, vestidas de branco, maquiadas como bonecas (aquela boquinha vermelha em um rosto pálido) caminhando pelo espaço da forma mais lenta possível. O cheiro de talco vinha do corpo delas. Ambas se encaminharam para a sala das pipocas (eu chamo assim), cada uma senta em uma das cadeiras. Estáticas se observam fixamente, um diálogo é travado, uma energia surge naquela imobilidade. Então, começam umas ações.

Comem, lentamente, as pipocas do balde. Esta lentidão vai desaparecendo conforme o ato de ingerir pipocas se transforma em cuspi-las no rosto da outra. Violência, fim das pipocas. O ritmo lento retorna, elas se retiram. A sala permanece até o término da exposição da forma que fica após a performance.

Eu andava pesquisando sobre bonecos e sobre butoh no período e alguns seis meses depois tive de propor um projeto para a lição pictórica de um professor. Não me lembrava exatamente o porquê mas, alguns elementos que agora são tão recorrentes em tudo que faço, surgiam naturalmente: repetição de uma mesma ação, longos períodos de permanência, preocupação estética além da ação. Brinquei com ilusão de sangue, por acaso usei groselha pura, bebi 3 litros e manchei uma sala de jantar, para um, totalmente branca (cadeira, mesa, talheres, vestimenta, etc.).

Deixei aquela melecosidade lá por um bom tempo depois.

Insetos diversos adoraram a idéia.

O professor jogou uma nota dez.

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